sábado, 21 de dezembro de 2013

O NATAL DE JOEL






Joel nascera num soalheiro e quente dia de Junho havia já 5 anos.

As aulas da pré primária tinham encolhido até ao tão desejado dia em que começariam as  suas férias mais apetecidas- As férias do Natal.



A árvore colhida ao nascer do sol, no pinhal da colina que fazia parte da  quinta onde Joel vivia, jazia ali  no soalho encerado da sala, inerte com os seus ramos entrelaçados como num ultimo abraço, ali mesmo  junto à lareira de canto. Os olhos de Joel entristeceram, pois agora não havia brisa para dar vida ao pinheiro. Este já não acenava no seu vai vem nem rugiria de fúria nos dias invernosos que chegavam.
Sentou-se no chão de pernas cruzadas olhando sorumbático a vida que deambulava à sua volta. O pai fora buscar um grande vaso de barro  e preparava-o para receber o pinheiro, colocando pedras no seu interior. A sua mãe trouxera duas grandes caixas  de cartão e abria-as resmungando como sempre o fazia quando as coisas não corriam de feição.
Joel via o pinheiro a crescer enquanto o pai o erguia ao ar arfando com o esforço e com um suspiro o colocava dentro do vaso.Pegou em mais pedras e colocou-as em redor do tronco até este ficar sereno e erecto.
Agora viria  aparte que mais adorava. A colocação das luzes e as coloridas bolas e por fim bem lá  no alto a estrela dourada....
Mas lá no fundo da sua mente, germinava uma ideia que desde há muito o apoquentava. Este ano iria apanhar o Pai Natal quando este viesse depositar em redor da sua árvore as tão gostosas prendinhas que todos os anos recebia....hummm será que este ano o Pai Natal me vai trazer um computador?- Pensou!

Lá no Infantário todos falavam da Internet... ele julgara a principio que devia ser uma doença, alguém muito importante ou algum monstro  pois todos falavam dela....uns tinham-na em casa segundo confessavam....então resolveu perguntar ao Pedro que era o seu melhor amigo se esta era algum animal de estimação  para ele também andar com ela de um lado para o outro. Pedro dissera-lhe  muitas vezes que estava na Internet na sala e no quarto e muitas vezes até na cama e uma ou duas  vezes na casa de banho. Mas Pedro era rico e excêntrico e fazia coisas que mais ninguém fazia. Joel só via um caso idêntico na sua vida....a sua cadelita Elvira! Ela também estava por todo o lado e até refastelada na sua cama, mas na casa de banho nunca entrava...porque seria?. Mas para sua surpresa o Pedro ficou com uma cara grande e parada....depois com uma boca redonda fez OHhhhhhh! Riu-se até sufocar....depois ainda com lágrimas nos olhos mas já com um ar sério disse -estavas a brincar  não estavas? As lágrimas tinham assomado por sua vez aos olhos de Joel que balbuciou apenas um simples não!.... Pedro sentara-se a seu lado com um ar grave e sisudo e então explicara-lhe o que era e como se devia utilizar.Nesse dia ficara a saber novas palavras que nada lhe diziam....engraçado!  Joel deixara escapar um sorriso enquanto a sua mente deambulava  lembrando-se perfeitamente,,,Down-loads, partilhar, likes, rato...hehehe julgara que era um rato a sério... teclado, open, blogs, google, hi5, facebook, twitter e-mail.....
Entretanto um movimento captou a sua atenção tirando-o dos seus pensamentos absorventes. O pai subia uma escada de metal e começara a colocar as luzes.....
E estas caíram enroladas no pinheiro e logo de seguida tiveram a companhia das bolas coloridas dependuradas nos mimosos e tenros raminhos. Viu o seu pai esticar-se todo colocando bem lá no topo a velha estrela dourada......


Seguiu-se o esguicho assobiante da neve artificial que caía para dar um ar mais autentico ....Depois foi só ligar as luzes à corrente eléctrica  para estas rapidamente começarem a luzir e a piscar. A Árvore de Natal ganhara vida!


Agora era a vez da sua mãe fazer o presépio colocando um estábulo de madeira  onde colocou o Menino Jesus na manjedoura, Nossa Senhora e S. José ao seu lado. O burrito e o gordo boi ficaram do outro lado aninhados oferecendo o seu bafo para aquecer o Menino. Um pouco mais longe os três Reis Magos  cavalgavam empoleirados nos seus camelos cor de mel. Por todo o lado Pastores e ovelhas e algumas personagens cantando louvores aquele que nascera para salvar o mundo. Fora assim que a Professora da Catequese lhes contara a história do nascimento de Jesus......
A noite caíra gelada na véspera do nascimento de Jesus. Joel na sua cama quentinha, agarrado à sua pequena botija em forma do Rato Mikey, esperava paciente que os seus Pais se fossem deitar...... Esta era a noite em que o Pai Natal viria depositar os seus presentes ao pé da árvore e ele que não era valente queria desta vez enfrentar o Pai Natal e agradecer-lhe por tudo o que este lhe tinha dado até então.
O calor da alcova invadira o pequeno corpo enrolado na caminha....

O Pai Natal descia pela morna chaminé da lareira apagada mas ainda com laivos de fumarolas....por detrás do sofá da sala, Joel arregalava os olhos de espanto e a sua boca fazia um enorme OH abafado.....Que grande saco tem o Pai Natal - pensou!
O Pai Natal dera um passo na direcção da árvore quando escutara o Oh abafado de Joel. Olhou com um ar doce e com uma voz que não se ouvia  chamou por Joel...
.Este contrafeito, com as perninhas tremelicantes e desconfortáveis, remexeu-se para se levantar. No solo o imenso saco estava aberto cheio de coloridos embrulhinhos contendo as tão ansiosas prendas.....




Joel! - Disse o Pai Natal.entregando-lhe um presente e outro, dizendo! - Este para a avó Maria, este para o avô Manuel....este para......
O rosto de Joel, antes ansioso e exultante começara a ficar mais inquieto, sério e soturno. Todos têm prendas menos eu -Pensou.
Por fim o saco estava já quase vazio....poucas prendas havia lá dentro e ainda faltavam as de sua irmã Rita e da sua cadela Elvira. As lágrimas queriam soltarem-se do seus olhos  mas não saiam porque estes estavam fechados......
OH não! -  gritou aflito.
Sentou-se na sua cama estremunhado....adormecera como um bebé enquanto o Pai Natal falava com ele ao mesmo tempo que lhe entregava as prendinhas para todos.....Oh   menos para ele....
Que fora que o Pai Natal lhe dissera entretanto?
Puxou pela memória enquanto enfiava o roupão e as suas pantufas de pelo quente.
Ah sim! Já se lembrava perfeitamente!
Olha Joel!  Sim fora assim que este começara por falar com ele....Há sonhos na nossa vida que serão sempre sonhos de magia. São sonhos que nos fazem grandes e pequenos, são sonhos que nos unem na vida e nos enchem de Amor por todos aqueles que amamos....fostes pensando enquanto te entregava as prendas em todos aquele que amas de verdade e fazem parte da tua vida, mas só te lembraste de ti, quando já todos tinham a sua prenda e o saco estava quase vazio.... acorda e vai até à Árvore.....
- Sim fora isto que o acordara - Pensou, enquanto se dirigia à sua sala e entrava de olhar aberto e sorridente. Fora bom dar todos aqueles presentes a cada um....à sua avó um xaile bem quentinho para ela se poder aquecer junto da lareira, ao seu avô uma bengala lustrosa com um cabo dourado  para ele poder ir buscá lo todos os dias à sua escola... ao seu pai uns sapatos novos, à sua mãe um colar de pedras azuis que vira um dia no shopping, à sua irritante irmã que tinha a mania que era rapaz,  uns patins de linha que ela tanto queria, à sua cadelinha uma bola de trapos e um osso gigante.....
Viu cada prenda no seu respectivo lugar....OH - Exclamou com surpresa. No seu lugar havia também uma reluzente e grande prenda.
O seu sorriso era enorme como a porta de uma garagem. - Que seria? -Pensou
Sentou-se no chão com o coração a bater bong-bong--bong-- Bomg---
As suas mãozinhas dextras começaram a rasgar entusiasmadas a sua prenda ao mesmo tempo que a sua mente  gritava- Que será?  que será?...
Nas suas mãos um vistoso computador azul faiscava ao sabor das luzes da árvore de Natal.





Lançou o seu olhar para a lareira e pelo canto do olho pareceu-lhe ver uma sombra fugidia e escutar um som que muitas vezes ouvira em filmes....
Oh-oh-ohhhhhhh!
Com um ponto brilhante no canto do olho e uma imensa alegria no seu coração disse - obrigado Pai Natal!
Depois possuído de uma estranha energia  correu para o seu quarto, pegou no seu telemóvel e ligou.....
Tocou e tocou a sua cantiga de chamada.....Porra atende! - gritou-
Estáaaaa! - escutou do outro lado. - És tu Joel? - Que te deu para me ligares a esta hora? São seis horas da manhã....
Não faz mal! - gritou exultante Joel.- Nem sabes o que o Pai Natal me trouxe..... Um computador novinho....azul como o teu.....sim! - Isso mesmo! - Só que tens que me ensinar a montar e a utilizá-lo.- Vens logo de manhãzinha quando os teus Pais deixarem? - Perfeito! espero por ti.....Já vistes o que recebeste do Pai Natal?  O quê? - recebestes uma nova bicicleta de montanha?.....pois podemos então dar umas voltas juntos  com a tua irmã Sofia e a Rita.........pois todos já temos bicicletas.....Sim eu sei que pedistes para poderes andar comigo..........
-Vem!

Jorge d'Alte



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domingo, 15 de dezembro de 2013

MADIBA









A cela confinava  o corpo no abraço curto das paredes sujas pelas garras do tempo sem fim....
Sem fim eram também as correntes de dias e anos que por ali passavam num mundo sem horizonte nem céus, nem brisas nem cheiros das flores silvestres, ou dos dejetos dos bairros pobres e míseros das cidades.
Os passeios outrora dados nos campos abertos em tons de liberdade  ou nas ruas citadinas, eram agora três para um lado e quatro para o outro, repetidos  vezes conta, do segundo ao minuto,  do  minuto à hora , da hora ao dia. Pelo meio ficavam os livros devorados pela fome do saber, os momentos de reflexão que traziam o saber e o saciar da alma e os parcos fechar dos olhos onde a mente vagueava idealizando no sonho os traços seguros da realidade de um Dia  o tal que gritaria Liberdade.

Os gritos e gargalhadas de criança dera lugar à Voz que não se calava  que exigia e se levantava numa mole Negra que de braço erguido enfrentava o fuzile que matava sem dó nem piedade, escrevendo com sangue nas paredes nomes e nomes de valentes que ficaram na história como heróis e gritando mesmo para lá do tudo a palavra temida " Liberdade".....
Por isso ali ficou, ano após ano até serem contados vinte e sete....






Como é fácil contar até vinte e sete, diriam as crianças que como ele lutaram a punho para serem alguém um dia....sua Voz foi o canto do pássaro que despertou todo um povo, Brancos e Negros, que cantou uma história que não podia ser cantada e o medo Branco  lívido como a morte aguilhoou essa Voz tornando-a como sua, muda e cativa e a cela foi dele por uma eternidade....Mas o seu carisma trespassava essas duras e grossas paredes e nos campos en as cidades a palavra Maldita   para uns era o sonho de muitos mais....Liberdade   gritavam as vozes cada vez mais roucas mas cada vez  mais próximas.....

E o Dia chegou, em que a Voz da Razão se suplantou em inúmeras vozes dispersas por todo o Mundo, mas poderosas apertaram o governo Apartheid estrangulando-o a cada dia que passara e a porta se abriu  e o céu regressou aos olhos e a brisa ao coração, e quando todos esperavam que essa brisa se tornasse furacão de raivas e fúrias incontidas, de vinganças ruminadas e merecidas,  a Voz ordenou que as cores eram só uma, que o Perdão seria a arma da Vitoria e a Liberdade o elo de União e que estas duas unidas  juntamente com o Negro e o Branco fariam um único Povo um novo País sob a bandeira do Arco Íris....

Tantos anos passados e a sua lição de vida foi apreendida nas cidades, correu as savanas e as florestas e voou como pássaro da esperança por todo o nosso mundo....

Olhos vergaram-se hoje na  dor de  todo um Povo de todo um Mundo onde a Voz era venerada como Luz da Sabedoria, do Amor e da Liberdade, aquele que escrevera mais uma das mais belas páginas da história universal.

Nas ruas o Povo chora dançando nos seu cânticos alegres, aquele a que Negros e Brancos unidos chamaram apenas de Madiba o Pai.

Jorge d'Alte






sábado, 7 de dezembro de 2013





Disseste que me amavas e partistes para sempre ao alvorecer do dia que já não viveste....





Todos os dias luto por ti minha Dulcineia inventada, como cavaleiro quixotediano solitário contra monstros e moinhos de fantasia onde a minha mente forja uma vida que não tivemos.....
Por ti  ergo a minha voz contra Demónios, Deus e Deuses sem misericórdia, que fabricam mortes em cada dia  ao sabor de uma vontade geriatrica, destruidora e diabólica.

De um qualquer ponto do céu, uma voz perfurou o denso nevoeiro que me cegava....a madrugada crescera lenta, tenra e cinzenta e apegavasse-me à pele como sarna  comichenta que não despegava.
A voz soara nas trevas soltas, como farol acolhedor e a branda luz tolheu-me por dentro, porque fora a tua voz que me emudecera e tornara estes olhos cansados e rugosos, humedecidos....
Tanto tempo levo eu nesta cruzada solitária deixando um rasto de bocados de mim, por ali e por acolá deixados assim à toa no esquartejamento diário da alma, que me movo como marioneta ao sabor do destino.... o perigo devia ser grande para Tu me avisares, minha deusa de véus ténues  como ténue foi a tua vida nesta terra mortificada por desventuras e arautos de infortúnios.
Os sentidos despertos, martelavam ao compasso do bater ritmado do coração.....O medo não vivia em mim, pois já tudo perdera nesta vida e o muito que a dor ferrara couraçou-me a alma....por isso aguardei!

A Besta movia-se pegado nas sombras tremelicantes de negrumes,  esticando como borracha as suas garras gélidas e afiadas....Tacteava-me por dentro, talvez tentando encontrar um ponto fraco em que se pudesse agarrar.... no meu rosto bailava um sorriso matreiro que aguardava por fim o tão almejado desfecho  que me levaria por um radiante e luminoso túnel até Ti  meu amor....Tinha ouvido falar tantas vezes em vozes baixas no restolhar quente da lenha brazida, quando a idade ainda era jovem, as matronas engelhadas de coração quente e pés gelados, que quando se partia deste mundo,  esse tal túnel de luz se abria  acolhendo-nos e levando-nos até ao paraíso ou inferno.....vozes amedrontadas por deixarem o mundo que conhecem, e enfrentarem um outro desconhecido....
O gelo ia subindo com a Besta Negra tacteando, tacteando em busca dos pontos fracos para tirar a vida....
A minha mente corria lesta como o vento enquanto o bater afrouxava a cada passo.... via o teu rosto sorrindo-me no alvor do despertar dos sentimentos e a minha gaguez tentando balbuciar a palavra mágica que tanto te queria dizer e que não saía....Não foi preciso, pois os lábios abraçaram-se em cataratas de rios de desejo e então soubemos que o amor era aquilo, aquele mel que embriagava  lúcido, aquele fogo que gelava tudo à nossa volta, mas ardia sereno nos corações....
Engraçado!
Espantado senti que a Besta parara....que o gelo que me invadira se derretia...e o coração voltara para mim batendo cada vez mais depressa....
Abri os olhos esperando ver o tão almejado túnel.... não havia a tal luz....nada....
Da janela lateral o sol entrara sem licença e aguardava no chão batendo e cegando-me com a luminosidade da vida.
Na áurea luz vislumbrei num parco segundo, o véu acenando na brisa quente e suave que me trespassou.....
TU!








Levantei-me do sofá ainda sem perceber bem o que me acontecera.
Agora sabia que quase partira e que TU vieras para me salvar com o grito que cortara as trevas que me engoliam pedaço a pedaço e rechaçara a Besta Negra....e me acordara.



Fechei os olhos por instantes....montei o meu cavalo pintalgado... empunhei de novo como lança a minha voz e chamei~te na lágrima que rolou...e caiu para onde?....E parti de novo na minha demanda até quando?
- Pensei.



Jorge d'Alte


quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O DESEJO








O desejo  foi a forma de eu nascer.
O desejo foi a forma que encontrei para crescer.
O primeiro amigo foi fruto desse sentimento, foi ainda com ele que amontoei ao longa da vida sonhos realizados, sonhos que não passaram disso mesmo, sonhos que se desfizeram  nas brumas por vontades de deuses  ou destino.....
Ainda tenho sonhos!
Ainda tenho desejos!
Algures estão apertados numa miscelânea sem fim.
Vivo em muitos deles como realidade.
Ainda tenho esse desejo que me move em busca de algo que eu nem sei....só sei que desejo.....
Um beijo teu?
Porque não? Ainda tenho esse fogo comigo que muitas vezes me faz corar....
Por ele, a razão morre e se esvai quando o vivemos....
por ele....

- Queres? perguntou-me, levantando ao de leve a saiota vermelha, garrida de várias cores.
- Quero!
- Então mostra o teu!
- Mostrei puxando os desbotados calções azuis para baixo.
- Oh!
- Oh!
Mas somos diferentes dissemos.....

Esse foi outro desejo que aprendi no futuro que já foi, agora luto pelo seu controlo e desejo sempre e sempre que escuto esses pés entrando, esse corpo rolado ao meu lado, essas mãos suaves como sedas. esses lábios doces como mel e então voo nesse sonho, até onde ele me levar.


Jorge d'alte

sábado, 9 de novembro de 2013





E depois do adeus...que restou de nós?

A árvore que chora, esse imenso Salgueiro selvagem derrama seus verdes ramos enfolhados sobre os meus ombros, como o faziam os teus cabelos doirados quando me beijavas o pescoço....Mas o gemido que lanço não é de prazer como então, mas de angustia frustrada  na impotência....a sombra que cai sobre mim não é do teu corpo dourado de mil tons de cobre, é a dor embuçada que transpira dos meus olhos  humedecidos, é a saudade que sinto do que um dia senti,. é o vazio frio que mora do outro lado na cama......
Foi aqui que um dia demos azo ao nosso primeiro sonho, quando as minhas palavras beijaram o teu rosto fazendo-o iluminar-se, quando os meus lábios saciaram os teus  de sedes de luxuria e tu soubeste tal como eu que éramos afinal só um, divididos tal como o coração  mas batendo num pulsar único levando nosso mel a todos os poros dos nossos corpos.....
Aqui posso chorar a saudade que trago, o amor que perdura para lá do tudo, a gota que enche a alma e transborda no olhar.
Aqui posso  sentir-te no restolhar dos ramos, na folhas levadas, na brisa que teima em me acordar com murmúrios doces, tal como tu o fazias nas noites frias em que acordar era dor por te deixar, era perder o calor do corpo entrelaçado, era não sentir o palpitar quente
do teu seio...

 Depois do adeus, olho este céu azul infinito, belo e vazio, quando eu sei que nele se escondem estrelas e mundos. Por isso espero pela noite, pois nela estarás sempre presente, mesmo que não te veja.


Jorge d'Alte

segunda-feira, 4 de novembro de 2013






Correu, correu até sufocar e cair exausto no chão seco e duro onde nada nascia.
Nem soubera porque fugira  e muito menos para ali onde não havia lugares onde se abrigar onde se esconder.
A sede gretara seus lábios finos e dormentes e a fome emagrecera até aos ossos, pois era só isso que tinha de seu.
Ao longe podia ver espessas colunas de pós avermelhados que corriam em várias direções como fumos de vulcões eruptivos e corrosivos de ódio e raivas ferventes.....cada vez mais perto....
Havia caçada e ele era a lebre a abater.....

Annyah sorria-lhe formosa nos seus anos quinze. A escola ficava do outro lado do caminho mesmo por de trás dela e era como formigueiro de vultos parados ou movendo-se.
Os olhos dele estavam aguilhoados à beleza de Annyah, e nada mais viam, pois ela era todo o mundo que sonhara, todo o calor que o incendiava, toda a força para um futuro.
Caminhou apressado os poucos metros que os separavam abraçando-a em palavras meigas e beijando-a como beija flor sugando o seu néctar.
De mãos dadas entraram na escola dirigindo-se para um grupo que gargalhava esfusiantemente. Depressa as suas falas se enredaram noutras e a conversa rolou de boca em boca de gargalhada em gargalhada, de sorriso em sorriso, de beijo em beijo, de apalpão em apalpão.
A sineta tocou mesmo a tempo, estridente e alta e o movimento foi de geral debandada em direcção aos destinos prévios de cada um.
A aula corria lenta e morna e os abrir de boca manifestavam a "seca" a que estavam a ser submetidos.
Ele via-a sentada junto à janela, colorida com as cores de um sol subindo dando-lhe um ar irreal de contraluz. Ela ia sorrindo-lhe com olhos sonhadores e meigos, prometendo....

B U MMMMMMMM

Estavam todos espalhados pelo chão com olhares esgazeados, aterrorizados  e mistos de incredulidade e incompreensão.
Nas mentes uma única palavra fazia sentido....que acontecera!

A forte  explosão abatera-se sobre portas, janelas e paredes destruindo-as e pelo meio do imenso pó volatilizado, pontas de fogo cruzavam mortíferas, cortando definitivamente gritos histéricos ou de agonia. Ele arrastava-se pelo chão com a cara sangrando por inúmeros cortes e roupas desfeitas. Annyah estava caída de lado com o seu longo cabelo negro espalhado e caindo-lhe sobre a cara. Depressa ele chegou até ela desviando amigos sem sopro de vida, corpos moles ceifados numa primavera descorada que chegara cedo de mais.
O troar de armas continuava como música funesta e o cheiro forte de cordite apoderava-se dos sentidos imputando nas mentes um terror impotente.
Eram muitos os poucos que estavam encostados ao imenso muro de betão, borrados até ao tutano e molhados de mijo quente.....
Sete homens encapuçados de armas em riste grasnavam ordens obrigando-os a ajoelharem-se  e disparando contra eles entre risos de alegre loucura e saudações aos seus deuses.
Annyah estava de pé junto dele e as mãos suadas e trementes davam-se num mutuo aperto de solidariedade e força.
Mas a besta insatisfeita, veio de sorriso aberto e podre, com dentes negros pelo consumo de fumos proibidos.
Puxou Annyah com força para ele, arrancando suas mãos das" dele" tentando beijá-la à força, mas a perna dela apanhara aquele ponto  critico do corpo dele e o sorriso perecera naquele hediondo rosto, tornado-se congestionado pelo escalarte da dor  infligida. O outro que o acompanhava puxou da sua faca de dois gumes espetando-a em Annyah antes que "ele " pudesse fazer qualquer coisa....
Caiu, caiu, mergulhando no seu próprio sangue e ali ficou de olhos abertos e parca respiração.
"Ele" saltou desesperado sobre as costas do meliante ao mesmo tempo que agarrava na faca que este deixara cair e lhe cortava o esgar de surpresa desse rosto.

"Ele" jazia ao sol, dependurado como naco de carne num açougueiro, com as mãos amarradas, coberto de sangue da cabeça aos pés. As moscas eram pequenas nuvens barulhentas  que o encobriam por momentos voltando logo de seguida ao seu ritual antropófago.

Horas, dias, semanas  "ele " não sabia, perdera-lhe a conta nos frequentes desmaios. À sua volta apenas areia e sol, ou negrume  e frio.... mas "ele " sabia durante os parcos momentos de lucidez, que as feras estavam por ali esperando o seu momento, limpando armas e facas para um outro qualquer massacre....
Annyah! Que fora feito dela?  Onde estaria o seu corpo esventrado? E o desmaio vinha em seu socorro levando-o para nenhum lado, talvez para um lugar onde nada sentia.

E um dia quando o sol  caia mordendo as dunas demoníacas e escaldantes e as sombras fervilhavam tomando conta da vida, ele sentiu-se caindo, mergulhando numa dor atroz...quanto tempo ali ficara estendido?
Acordou com um gemido na boca negra e gretada, mexeu-se na dor embuçada  e ali ficou de novo sem nada sentir.
Acordou mais tarde no gelo da noite com a Lua cuspindo pedaços de luminosidade por entre nuvens sem água que vogavam como miragem ....levantou-se por entre tonturas cruciantes, dirigindo-se para lá das dunas com as pernas mergulhadas na areia ainda fervente.
As fogueiras em forma de imenso anel  tinham palmas batidas nas sombras e as vozes desafinadas troavam palavras arrastadas.....no solo iluminado pelo fogo, pequenas figuras nuas gesticulavam a dança ora arrastando-se, ora saltando, ora caindo....então a ponta do flagelo caia sem dó estalando no ar antes de arrancar grito e pele,  ferida e sangue, e os risos ecoavam enquanto o vulto tentava erguer-se de novo. Annyah estava entre elas,, vestida com o vermelho do seu sangue, dançando uma dança zombie. Não queria cair de novo, não queria ouvir mais o ar cortado e o flagelo lacerando o que ainda sobrava da sua pele....

A arma estava ali mesmo como que chamando por "ele" arrebanhando-o da dança e lançando-o na realidade da vingança e loucura .
As mãos dele ainda azuladas e sem sangue pegaram na arma .....Gritos confusos e incrédulos saíram das sombras, caíndo no solo como tordos ou sobre as fogueiras como sacrificados ao Deus do fogo, ou como tochas humanas riscando a escuridão em arabescos coloridos......

Depois viu as raparigas e Annyah e rapazes nus correrem para fora do circulo perdendo-se no algures negro da noite.
Sentiu o ar deslocar-se sobre a força das balas que por ele passaram procurando as pontas da sua carne.

Era tempo de fugir também, por isso arrastou-se por metros sem fim, depois agachado tentou correr e correu, correu,correu e o sol veio como sempre airoso indiferente e fervente, massacrando seu corpo sem suor e sedente.


Correu, correu até sufocar e cair exausto no chão seco e duro onde nada nascia.
Nem soubera porque fugira  e muito menos para ali onde não havia lugares onde se abrigar onde se esconder.
A sede gretara seus lábios finos e dormentes e a fome emagrecera até aos ossos, pois era só isso que tinha de seu.
Ao longe podia ver espessas colunas de pós avermelhados que corriam em várias direções como fumos de vulcões eruptivos e corrosivos de ódio e raivas ferventes.....cada vez mais perto....
Havia caçada e ele era a lebre a abater.....

A sombra projectou-se por fim sobre ele como manto protetor contra os raios do sol alto. Não fora o cano azulado apontado à  sua cabeça, e agradeceria aos deuses esta benesse, esta sombra.

"ele" levantou-se a custo. Não morreria como rato no chão arenoso e duro. Isso nunca!
Seus olhos ergueram-se cuspindo todo o seu ódio, desafiando o seu opositor expondo seus ossos ás balas...
Sua prece foi um nome que gritou e ficou por ali preso nos ecos que motivou.
Annyah!
Annyah estava ali de pé, nua e sangrenta de olhar esgazeado de loucura  e tremendo.
A sombra caiu, caiu vagarosamente sem vida nem voz e o pó elevou-se deixando ver na sua nuca avermelhada o cabo de osso de uma faca.

"Ele" segurava  a mão de Annyah
À sua volta o mundo soltara-se e a musica elevava-se
Beijaram-se nesse fim de tarde
A vida corria à sua frente deixando pesadelos passados para trás.



Jorge d'Alte








sábado, 26 de outubro de 2013




Abri a janela!
O sol entremeava por entre a longínqua folhagem das árvores centenárias de tantos nasceres.
Enchi eufórico o meu peito, com o ar pingado de fresca geada que alfinetou os meus pulmões com agulhadas de ar frio,
O sono fora deitado relaxado em alcovas de nuvens fofas e o sonho fora dourado com tenras imagens que sorriram na minha face e o acordar fora alvorada cheia de cores de esperanças e sentimentos.

A névoa crescia envolvente no lado oposto onde o sol nascia. Era poente nessa outra terra onde gigantescas montanhas vestidas de branco se abriam em vales profundos onde casas estavam plantadas como malmequeres por aqui e por ali.  O rio de prata descia barulhento a penedia abrindo caminho tumultuoso e decidido cruzando ziguezagueante esse vale de verdura para lá de tudo....

Ali vivia eu ,tu e muitos mais.

A vida simples levava-me à escola de teto de colmo sem paredes nem vidraças e de bancos toscos feitos de árvores cortadas, ao ribeiro onde mergulhava os pensamentos sentado na pedra desgastada coberta de liquens. Muitas vezes o livro contava-.me histórias de terras imaginadas pela falta de gravuras e como cego tacteava na minha mente os contornos de vidas tão irreais, com cheiros inodoros e ruídos de silêncios.
Tu vivias ali ao meu lado enfiada na saiota feita de folhas largas com lianas entrançadas, Outros viviam por ali, indo e vindo em labores tantos e a carne assava na noite salpicada por faúlhas rubras que se apagavam como almas já vividas. histórias eram contadas e cantadas pela voz roufenha e pastosa  do mais "Velho". Do seu cachimbo saiam fumos azulados que escreviam no ar quente figuras que eu imaginava. A criança que era eu estava sentada a seus pés absorta e bebia todas aquelas memória como se fossem minhas, para que nunca se perdessem no inferno da vida. O sol julgara eu, vivia apenas ali, para mim e para ti e muitos mais....

O livro cujas letras tremelicavam com a luz da vela acesa diziam que para lá onde o sol caia, havia outra vida e muito mais....pessoas que viviam umas em cima das outras, que corriam para um trabalho sem lanças nem arcos, para trazerem comida para dar aos seus filhos - como podia isto ser? - onde incendiavam as fogueiras para assarem as carnes e os peixes? Onde mergulhavam se não tinham rios? Onde colhiam os frutos  se não tinham árvores?....

Quantas vezes passara o sol desde os montes brancos até onde o rio desaparecia na imensidão impenetrável da vegetação....
Ali vivia eu, tu e muitos mais, mesmo os que já não eram, mas viviam nas lendas e histórias contadas e cantadas à volta de fogueiras....
Tudo se tinha transformado até os corpos tinham crescido até ficarem diferentes.
Ali vivíamos nós e  poucos mais até o mundo abalar e se abrir numa estrada diferente, e agora onde o sol caía nascera uma nova vida no outro lado onde o sol nascia.

Ali vivemos nós e muitos mais, uns em cima dos outros, correndo apressados sem lanças nem arcos para trazermos comida para os nossos filhos. Já não haviam fogueiras nem lendas contadas nem cantadas, apenas a vida passada correndo e o por do sol caia não na verdura impenetrável, mas em cimentos amontoados, montanhas como colmeias de abelhas, como formigueiros de lavor onde todos trabalhavam de manhã ao por do sol. Montanhas não de terra e verdura  mas de betões erguidos aos céus como desafiando Deus.Os fumos não eram azulados antes negros de alcatrões derretidos, e intoxicados....

Quantos Sóis  e sóis passaram sem mitigar a saudade que ficara?

Aqui vivemos nós, os filhos e muitos mais....

Percorremos o dia de lanças e arcos caçando!
À noite, ao redor do fogo contamos lendas e cantamos alegrias. O cachimbo que eu chupo evola fumos azulados e as memórias pairam nas mentes para nunca serem esquecidas.
Aos meus pés a criança sonha com seus olhitos negros e vivos desenhando e criando no seu mundo novas formas de vida e de manhã quando o sol nasceu abri a minha janela....

O sol entremeava por entre a longínqua folhagem das árvores centenárias de tantos nasceres.
Enchi eufórico o meu peito, com o ar pingado de fresca geada que alfinetou os meus pulmões com agulhadas de ar frio,
O sono fora deitado relaxado em alcovas de nuvens azuladas e fofas e o sonho fora dourado com ternas imagens que sorriram na minha face e o acordar fora alvorada cheia de cores de esperanças e sentimentos.






Jorge d'Alte

sexta-feira, 11 de outubro de 2013







A minha mente parecia uma galinha a espolinhar-se na terra húmida tentando bicar pedaços de saudade, bocados de um "eu" que deixara algures nas planícies férteis onde tu existias.....

............................Passos mordiam o chão de terra arenosa, levantando pequenos grãos de poeira como nuvens no meio da modorra. O olhar acerado não prenunciava nada de bom e os lábios cerrados continham lá dentro tanto para gritar e a fúria vencia obstáculos atrás de obstáculos, levando o corpo frágil e franzino de Maria.






Tudo começara algumas horas atrás no meio da nuvem que não era, feita de fumo cinzento e oloroso, como a alma minha que se entristecia perante a indiferença...
O corpo movia-se em bocados discernidos por entre a fumaça e corpos anónimos de nomes que desconhecia, mas os meus olhos perdidos sonhavam esse corpo de pele dourada e cabelos de cobre, caindo e baloiçando sobre ombros que eu beijava em sonho.
Tudo fora lindo como história escrita, escondida nas capas da minha mente, mas transbordara pelos meus lábios numa frase interrogativa " a menina dança com o eu, que eu danço com o tu?"




O rosto surpreso abriu-se como flor de madrugadas e o sorriso cresceu fazendo agigantar-se esse nó na garganta, esse comichar na barriga, esse bambolear de pernas moles, mas as suas mãos como suaves gavinhas agarraram-se ao meu corpo aprisionando-o no ritmo, como seara dourada dançando na brisa soprada.
Dois olhos negros que amei, tão profundos como infernos de perdição, pegaram nos meus azuis como céus abertos de eterno sol e dançaram em palavras murmuradas aos ouvidos e seladas no beijo súbito que aconteceu.....
E pronto!
Foi como bofetada!
A fumaça desapareceu de repente quando a porta bateu nas nossas costas e os passos cresceram, mordendo o chão de terra arenosa, levantando pequenos grãos de poeira como nuvens no meio da modorra. O olhar acerado não prenunciava nada de bom e os lábios cerrados continham lá dentro tanto para gritar e a fúria vencia obstáculos atrás de obstáculos levando o corpo frágil e franzino de Maria.
O meu coração batia atrasado, tentando conquistar os segundos perdidos num alcance impotente, enquanto a mente chorava por dento e o lamento questionava " que se passara ali".
Por fim os passos abrandaram, ficaram lentos e pararam e a fúria secou e como visão fantasmagórica o corpo se virou para mim sacudindo para fora " porque fizestes aquilo?"
A minha cara deve ter-se derretido toda no esgar de incompreensão primeiro e de compreensão depois
" o beijo!"
Nunca pensara que um beijo provocasse vendavais tamanhos como relâmpagos na tormenta que vislumbrava faiscando nesses olhos negros que tanto amara.
"Sabes nunca fui beijada dessa maneira e senti-me sugada para um abismo e de repente fui lava num vulcão desconhecido que me encheu de um sentimento tão forte que explodiu cá dentro da minha cabeça. Assustei-me e fugi, mas agora quero isso tudo só para mim, até á eternidade".
E a eternidade cresceu em rostos enrugados de peles manchadas, mas todos os dias o beijo acontece mesmo quando não estás, e cresce de novo como nova alvorada.....


jorge  d'alte

quarta-feira, 2 de outubro de 2013

RECORDAÇÃO










As recordações vieram, tropeçaram num ramo de neurónio e ficaram ali levedando azedas e brilhantes.......





......Vieram do outro lado como ratos petiscando queijo duro em pão de côdea.. Sentaram-se em volta de um fogo que estarlejava faúlhas aguçadas que ardiam em ápices e chamas que se atiçavam rubras de prenhe fúria, em caixotes de madeira escurecida de cheiros nauseabundos, misto de gorduras e outros tantos e as vozes roucas e roufenhas , esganiçadas e ansiosas trespassaram para ouvidos que escutavam novas de outras partes deste mundo que já fora aquilo, a que chamavam paraíso.
Disseram que o céu era preto e as estrelas brilhantes outrora douradas não passavam de meros pontos azulados esbatidos nas sombras negras como morte sem luz. A lua vogava nessa imensidão sem ondas nem brisas e a sua cor leitosa de manto luarento, era agora mancha prateada como salva oca cheia de nada.




.....Vieram do outro lado brisas estranhas que ora murmuravam em surdina em ouvidos moucos, ora gritavam a sua raiva por um sol enegrecido sem madrugada, por mares e montes sem por- de- sol e o ar como aço gelado cortava as falas com vapores falados como falsos fumos onde se perdera o fogo.
.....Vieram do outro lado passinhos sem som, que barulhavam na terra esboroada de parca água,.Chegaram-se ás vozes algo agitadas com olhos sem brilho nem sorrisos gaiatos.Deixaram-se ficar por ali mudos e quedos como sombras de pedrenia que nasciam plantadas por ali ao Deus dará.
.....O sufoco estrangulou o ar que arquejou num soluço parco de som, mais um gemido de ratinho perdido na cor do medo sentido.....que mundo era este onde fora parar?
.....O ar rarefeito esgaçava o peito com  a dor do respirar e o abismo estava ali na ponta dos pés, indefinível e cativante, atraente e suplicante. Afinal seria como um voo de pedra, rápido e estrondoso com batidas de permeio, talvez em arestas aguçadas como esquinas dobradas de ruas perdidas, que um dia trilhara e em cada uma gritara dores consentidas e sentidas, de erros  cometidos como criança que dá os primeiros passos, se esfola e chora. mas se torna  a levantar já a sorrir.
.....Vieram em pequenos fogachos como tochas tremelicando, esticando nervos e transmitindo ordens autoritárias que deviam ser cumpridas.....
.....Vieram quando os olhos se abriram por fim de palpebras quebradas e as recordações se foram e a realidade se focou . O pesadelo estava ali num lado que não fora o meu, ainda semi quente e semi frio, com cheiros e odores de perfumes tontos que se cruzavam em mistos de suores e perfumes variados. Fora um dia um lado quente que dera vida e cor; fora sol nascente de risonhas madrugadas, poente que trouxera as noites de encanto onde vultos se embrulhavam como marionetas de sombras, fora lua alva mergulhada em lençóis de linho, fora luxuria quente e sedenta, fora fogo que matara sedes que construíra paraísos  onde voara livremente de sorriso empunhado.....




Jorge d'alte

(Fotos tiradas do google)

quarta-feira, 25 de setembro de 2013











  Cara a cara um vampiro e um lobo ..... 
  Ajoelhada no chão a pequena figura      humana tremia de puro terror.

As mentes dos monstros estavam cheias de ódio e a raiva crescente fervia e caia como baba nojenta que escorre de fouces disformes e selvagens.....
A apetitosa figura humana já não tinha preces para enviar a Deus, nem sms de ajuda, nem céus de paraísos onde se pudesse refugiar, nem a vida que julgava perdida para sempre. Tinha apenas sangue correndo em adrenalinas constantes e crescentes que aguçavam o apetite selvagem e devorador das bestas. E eu era uma delas, de garras esticadas,preparado para a luta que se avizinhava com o meu eterno inimigo…. Por isso rodava num movimento  arqueado pronto a saltar ao mínimo sinal de alarme atacante….

Por um momento, eles ficam confusos. Uma bolha de lucidez encheu prenhe de compreensão, fecundando no intimo do coração algo que refreou fúrias, raivas e apetites....
As asas c
aiem em submissão, as patas e garras encolhem-se  envergonhadas e o som gemeu saindo de gargantas sofridas e descrentes.

O pequeno ser humano olhou para cima com esperança em seus olhos. O que está acontecendo? - Pensou.

O lobo soltou um uivo triste de angústia. O vampiro piou sua dor e mágoa.....
Reconheceram-se as almas. Em suas mentes sabiam que eram grandes amigos numa outra pele....peles lisas e rosadas ou tostadas pelo sol de parcos anos. Mãos que se tinham dado e apertado em momentos de alegria ou pura dor. Olhares que se amavam numa  amizade sem fim, lágrimas que tinham corrido nos erros cometidos, palavras que foram brisas que insuflavam novos sentidos à vida..... tanto ali dentro das suas almas....uma simples chama que ardia intensa num calor chamado "amor"

Ó não !-  Gritaram reconhecidos, olhando depois espantados para a pequena figura jazida....esses olhos eram ....
Não pode ser!- Gemeram em uníssono.
Esse frágil ser humano era amado por eles.
Era a irmã de um deles e a namorada do outro ....

Vampiro e Lobo abraçam-se tão fortemente. ali onde viria a ser o seu leito de morte.
Não foram precisas falas nem palavras gastas de um passsado que ficava ali.
As suas almas choram por dentro a sua desdita pois o ciclo tem que seguir o seu trajecto e os corpos ardem da mingua de sangue que têm de sorver para sobreviverem mais uns dias, mas as lágrimas que caiem são reais, rolam e são pérolas em seus olhos... estarão juntos pela ultima vez em peles diferentes ...Já não terão que esperar muito, pois a luz do sol nascente  desponta por detrás do horizonte montanhoso, essa luz que dá vida à vida mas que para eles será o fim da linha; a morte!
E esta chegou devagar numa atroz agonia, não vestida de negro como a noite, mas com a luz radiosa da vida.

No chão a pequena figura humana gemeu.....a dor arrastou-se pelo chão como rastilho e rebentou dentro do seu peito em miriades de dores, sentimentos espetando, o vazio da perda. 
A solidão veio mais tarde nos momentos passados sem.... e apoderou-se dela por longas e infinitas noites e conta-se por aí à boca cheia que, em noites de lua ainda se ouvem os seu gritos ecoando, chamando pelos seus nomes

VENTO.....
BRISA.....

E a nuvem fofa que é ela prossegue seu curso solitário ao sabor.....


Jorge d'alte




domingo, 15 de setembro de 2013











Era a lua na noite negra!


O meu amigo vampiro começara a transformação. Alguns longos segundos passados fora um lindo adolescente com nome, amigável e amoroso, verdadeiro e ternurento.
A sua pele outrora tão macia de bronze adocicado, era agora um monte de pelos negros e castanhos entremeados com peles encarquilhadas e descartáveis e a sua cara disforme tinha um olhar selvagem.
Sangueeeeeeeeeeee! Saaaaaaaangue! Era a palavra que dançava na sua mente retirando-lhe os últimos resquícios de humanidade e os seus braços que abraçavam antes corpos cheios de amor, eram agora asas batidas na imensidão da noite…Ele podia voar, voar,  voaarrrrr e voava….

Noutro lugar mais remoto um corpo estava repleto de espesso pelo. Seus braços eram agora patas ferozes com unhas assassinas e afiadas e os dentes esbranquiçados e pontiagudos concorriam pendentes com a espuma que caia em cachos pegajosos.






A lua não brilhava, protegida por nuvens voadoras que corriam apressadas fugindo de um perigo que não entendiam mas persentiam. Seus olhos pardos e radiantes dourados viam o que antes não conseguiam ver e andavam por ali predadores e sôfregos procurando o seu néctar para a vida e o seu nariz cheirava o ar procurando avido a carne humana onde havia veias enfunadas com ventos correntes de Sangue. E à sua mente acorreu a palavra que o motivava Saaaaaaaaaaaaaaaaaangue! Sangueeeeeeeee!

O vampiro voava em silêncio pelo meio das sombras vastas, bastas ou meias, como meia hora era o toque que o relógio batia no velho campanário que por ali existia. Teria pouco tempo para realizar o seu eterno calvário e mitigar o seu eterno vicio. Teria sem falta de beber o liquido morno e espesso de cor avermelhada normalmente doce mas muitas vezes acido da cor do terror infligido. Algures o sangue corria em doces veias como rios e apetecíveis corações ainda palpitantes.

O lobo que eu era, corria por montes e campos, por terras de areias grossas ou águas geladas. O cheiro que me chegava ao olfacto trazido pela brisa errante estava por ali perto e de novo farejei e….Incrivelmente junto colado como praga pegajosa, havia um novo cheiro que me incomodou….
É um vampiro! -  gritei rouco, para logo soltar um uivo agudo de aviso e provocação.

Uauuuuuuuuuuu!  Uauuuuuuuuuuuu!

Hummmm murmurei com a raiva toda mordendo a minha própria fúria.

O súbito chegara num ápice ali, num face a face receoso mas dilacerante de vontade feroz e avidez incontida por sangue.

Ajoelhada no chão de relva esmagada e húmida, uma pequena figura humana tremia indefesa possuída de intenso terror…..




(agora imaginem e terminem o resto da história que vos contei e tracem o final da mesma)

Jorge d’alte

segunda-feira, 9 de setembro de 2013











O vento lançou no ar a sua melodiosa ameaça que repuxou para trás os meus cabelos já revoltos e cacheados, roubando-me ao mesmo tempo o sorriso que esboçava no rosto bronzeado por mil e um raios de sol....




No cimo da falésia quebrada a meus pés, eu abri os braços como se quisesse voar naquele vento que parecia odiar-me a cada rajada uivada....

Seria um gesto como um Deus omnipotente?
Seria apenas um sinal de impotência contra desígnios mais fortes?
Seria....
Abarquei o ocaso neste gesto, tentando parar o tempo que nunca pára, que voa do segundo ao século, que nos leva do berço à morte, que nos leva do primeiro passo ao ultimo, não nos dando o tempo desejado nem a sabedoria de viver uma vida que rasgamos a cada momento com erros atrás de erros, com promessas sem prazo de validade, com ilusões de amores falseados....
Foi a palavra que queria gritar-te que me levou a este apogeu encimado, Foram tantos os sentimentos fluidos que se engasgaram numa garganta que não  teve o pejo de falar.
Os olhos, esses cantavam esse amor que ia na alma, que corria nas veias sedentas, mas que se entrechocava em tempo que já passara. Não foi uma nem duas , as vezes que te quis soprar nos ouvidos os murmúrios doces do meu coração, que quis pegar nessas mãos douradas  de dedos esguios, que quis a luxuria dos teus lábios rosados, desse corpo maleável e delgado, coração que sonhou sonhos dessa pele bronzeada como sedas do oriente, que se quis deitar nesse ventre oferecido, nesses seios tumescentes mas desleitados....

Tal como o vento que soprou, o momento passou e  não voltou  mais e eu sôfrego, rumo
cada dia a esse inferno que um dia foi paraíso para mim, ainda que apenas por uns segundos que não vivi.


jorge d'alte

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

O OLHAR !



O olhar estava deitado nas ferventes areias douradas da praia. Embora dolente e letárgico estava atento e predador, fazendo calmamente a sua triagem.
À sua volta rostos misturados com corpos, soltavam gargalhadas, risos, palavras… a bola saltava de rosto para rosto quer nas pontas dos pés, quer na ponta do dedos ou numa qualquer raquete...

O olhar fazia parte de um rosto e tinha olhos azuis…

A água eivada de espuma alongava-se ameaçadora enrolando gãos e grãos de areia nas suas intermináveis voltas onduladas e os cinco olhares moviam-se por ali vogando e espreitando por de cima da ondulação. A bola também lá estava vogando na crista da onda até a mão a agarrar. Estivera antes movimentada no areal, nos pés de quatro olhares, voando airosa e rodopiante de pé para pé entre risos, gritos e impropérios.

O olhar de ar soturno, mastigava na mente uma melodia nova que tecia, acompanhada pelos risos de brincadeira dos outros quatro olhares que permanentemente se cruzavam reconhecidos numa amizade que era deles.
O olhar era solitário mergulhado nas trevas de uma tristeza interior que ensombrava o rosto dele. Não procurava a vida, antes fugia dela. Não tinha o futuro brilhando na menina dos olhos, nem tudo aquilo a que chamam sonhos que já eram. Apenas percorria talvez os últimos metros de uma vida. A sua alegria que gritara muitas vezes no seu olhar ficara perdida algures numa esquina ou viela e numa encruzilhada por aí nascera a fera chamada tristeza, saudade, mágoa ou filha da puta. Era feita de dor, aquela que dói por dentro e nos perde, aquela que renasce a cada lembrança, a cada ida ao passado.

O olhar uma vez mais mergulhou na água tépida passando por de baixo da onda gigante e escorregadia, trazendo à tona um novo arfar, um sorriso triste e uma nova nota para a melodia…

A nota saiu fortemente dissonante.

Perante ele um dos quatro olhares estava fixo no dele, num meio sorriso, numa meia promessa… 
OooH! 
Murmurou o olhar preso nessa teia imensa e sem fios. 

Era um rosto lindo que ali estava perante ele, cheio de mistérios, ternura e de sorrisos. Era talvez a nota que o olhar procurava para terminar a melodia ensaiada.

O olhar fazia parte de um rosto e tinha olhos verdes….



Jorge d’alte

(fotos retiradas da net)

quinta-feira, 29 de agosto de 2013




As gaivotas cresceram trazendo nos bicos as pontas da madrugada.
O véu da alvorada caiu em ondas de sol e as nuvens outrora negras, alegravam esse céu agora azul como bolas de algodão macias velejando no vento soprado, restos da minha voz que um dia gritara.

Chuvas de dor imensa caíram sobre mim nesse momento atroz, como agulhas espetando cada vez mais fundo e mais dolorosas.
O sol queimava como a saudade que tenho cá por dentro em cada célula em cada rio de sangue. Julguei que seria fácil encontrá-la e removê-la com um simples click, mas a safada diluiu-se por ali e veio rápida morder-me na mente ficando por ali refastelada e mordente…..

Esta fora a outrora dos dias em que me arrastei por becos e calçadas, ravinas e planícies, em desertos gelados sem areias quentes, em abismos de silêncios perenes, sempre com teu nome invocado…..
Em que fiquei esmagado como insecto pelo peso da magoa que carrego, em que fiquei despido de todos os sentimentos embrutecidos pela dor que dói e não vai.....
Doces foram as drogas que tomei no esquecimento, como sorrir chorando, como caminhando sem ir, como sonhando sem sonhos, como abraçando formas de ti por entre fumos de tabaco, por entre risos idiotas, por entre danças sem musica, gargalhadas sem ecos, por entre beijos sem gemidos, por entre sabores sem sal de suores de feromonas, por....sei lá!

Agora que o fim veio para ficar num filme de vida sem replay, o sorriso cava meu rosto  iluminando-o com a miragem de ti neste deserto sem sopro de vida…..
Para lá do ultimo sopro estás tu,como sempre, bela na juventude que sempre tiveste,  enquanto a minha velhice me definhava em lagos de dores, em rios de raivas, em abismos de inconformismo, em mares de eterna saudade….
Por fim juntos estaremos para sempre vogando como cisnes celestiais na eternidade dos tempos, em lábios colados, em línguas de fogos estradelejantes, em laços de nós apertados como abraços em peles suadas com carinho, com os perfumes da luxúria, em êxtases para lá do tudo e do nada, num mundo que é e sempre será só nosso……






Jorge d’alte

(Fotos retiradas da internet)

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

O LUGAR VAZIO


O lugar vazio vivia ali mesmo defronte

Ele estava sentado olhando para nenhures

Os olhos brilharam clareados por pingas de fogo, flamulas de  dor....Ó Meu Deus eram como ferida aberta dilacerante e fervente!

No outro lado da alva toalha de mesa a flor sorria de pétalas abertas triste e solitária.






A tristeza era musica sem notas, choros suplicantes no silencio, gritos de solidão dormente um aí de profunda mágoa que teimava em não se soltar.




O copo meio cheio brilhava sanguíneo esquecido no meio da dor...já não aquecia a alma dele nos tragos sorvidos como alfinetadas para o esquecimento.

No prato esquadrado na sua forma o bife mal passado esperava e desesperava rodeado de dourados fritos de batata. No cimo como olho arregalado o ovo vigiava o apetite que tardava.....

Era meia noite nas badaladas sonora do relógio de capela....A mão moveu-se sozinha pegou no copo reluzente de revolto néctar levando-o ao alto atingindo o céu que é teu...

A voz sofrida soluçou "até sempre" e caiu mergulhando na dor que ficou......


Jorge d'alte





domingo, 4 de agosto de 2013













Os pinheiros agulhados de braços abertos e erguidos para o céu, na vanglória desumana de alcançarem Deus......
As raízes profundas investem pela terra apertada de secura prendendo-os como âncoras ás coisas terrenas até que um dia numa qualquer fatal madrugada, a força do machado cairá sem remissão e livre então erguer-se-à aos céus de Deus  como évolos de fumo perfumado...





  Jorge d'alte